sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Por falar em ciência

Recebi há pouco tempo um email que muito sinceramente era capaz de fazer o menino Jesus chorar. Passo a citar, sem mais delongas, o email que me chegou com o seguinte subject:


Educação Sexual: as 10 perguntas (ainda) sem resposta


"No próximo dia 19/01/2010 vai ser lançado, na Biblioteca Municipal, Camilo Castelo Branco, em Vila Nova de Famalicão, o livro “Jovens com Saúde – Diálogo com uma Geração”, de Daniel Sampaio e Margarida Gaspar de Matos que são dos principais responsáveis pela definição do actual modelo compulsivo de educação sexual na escola.


Devemos aguardar com expectativa esse momento, pois esperamos que finalmente se revele:  


  1. quais os pressupostos teóricos que permitem pensar que o modelo vai resultar;
  2.  onde foi o modelo submetido a "experiência", ou pelo menos a uma "quasi-experiência", com população de estudo e de controle estatisticamente equivalentes;
  3. quem foram as personalidades independentes e de reconhecido mérito que levaram a cabo essa experiência;
  4. qual a amostra estatisticamente representativa da população escolar portuguesa que foi estudada;
  5. consequentemente, onde foi verificado que os bons resultados previstos no modelo foram de maneira tecnicamente significativa constatados na prática;
  6. em que revista com referee e indexada no ISI (as únicas relevantes para a FCT) foram publicados os resultados dessa avaliação;
  7. qual o follow-up da experiência;
  8. em que países foi um modelo semelhante aplicado;
  9. em que países um modelo semelhante foi associado à diminuição da gravidez adolescente e das Infecções de Transmissão Sexual;
  10. qual o efeito previsível da distribuição de contraceptivos hormonais ao nível da saúde física (cancro, antes de mais) e mental das alunas, ao nível relacional e ao nível da feminização da pobreza (no sentido de G. Ackerloff o Nobel da Economia que estudou o efeito dos contraceptivos na sociedade). 
Até termos respostas claras e objectivas a estas questões, não há razões para considerar que o modelo legal de educação sexual se funde num trabalho científico metódico e sério.

Na falta dessas respostas, apenas haveria razões para pressentir que é um modelo exigido pelo “achismo” de pessoas cuja falta de qualificação em educação sexual era, aliás, já de todos conhecida."


Uma resposta clara e objectiva é que quem escreveu isto não faz a mínima ideia do que quer dizer Ciência, nem o que quer dizer científico. Sim, é um termo de difícil definição e assim sendo pode ser utilizado como arma de arremesso aquando de discussões com vista a intimidar o interlocutor, mas o pior é que tal não resulta comigo. 
Para já começam por pedir referências a experiências passadas sem sequer se darem conta do quão idiota isso é: se toda a gente fosse a pedir por experiências passadas nunca tal medida seria implementada (isto é tão simples que até um miúdo de 5 anos lá chegaria). Ou seja alguém inevitavelmente tem que se chegar à frente e esse alguém pode muito bem ser Portugal.


Depois vêm com as reconhecidas personalidades... E muito sinceramente nem vou comentar o valor científico que tem este pedido, mas digo que é imenso. Faz-me lembrar a história de um Matemático que nos tempos antigos chegou a uma Universidade com uma carta de recomendação de um outro Matemático mais velho e do mais alto gabarito que basicamente louvava o matemático mais jovem. Claro que a pessoa a quem o Matemático que o recebeu tomou a atitude mais inteligente que se podia tomar: mandou-o para trás e disse que aquela carta não tinha valor nenhum uma vez que ele não o conhecia de lado nenhum. Assim sendo o matemático mais jovem decidiu escrever um manuscrito com algumas das suas descobertas, dirigiu-se de novo à Universidade e desta vez sim foi aceite... 
O que é isto tem a ver com o que atrás disse não sei, mas por algum motivo decidi contar isto aos leitores...


O ponto 4 e 5 até são bons mas falham pelo facto de que tem sempre que haver alguém que se chegue á frente em primeiro lugar. Porque se ser científico é repetir mecanicamente o que alguém já fez então não há nada mais científico que as linhas de montagem.


O ponto 6 é do mais idiota e simplista que pode haver e muito sinceramente demonstra bem a distância que separa quem escreveu o texto da prática científica actual.


Os ponto 7,8 e 9 é mais do mesmo e chega de bater no ceguinho e o ponto 10 para além de nada é um bocadinho de name dropping. O que como toda a gente sabe é do mais científico que pode haver: dizer ma nome de uma pretensa autoridade num dado assunto é demonstrar uma imensa agilidade intelectual e uma vontade sincera de participar num troca de ideias como não á igual.


Agora vou mazé acabar o que tenho a fazer que não me pagam para isto...

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